segunda-feira, 10 de julho de 2017

A lição da felicidade

Em tempos de rede social, Facebook e smartphones, eu realmente ando muito confusa com o que é a tal felicidade. Meus 700 amigos costumam postar fotos na praia, na balada, deitados na rede, no barzinho, na academia e nos seu carros indo viajar sorridentes! Adoro, me sinto uma Big Sister por trás das câmeras acompanhando todo esse movimento. Eles realmente parecem felizes e satisfeitos com tudo. E eu por poucos instantes chego a me sentir mal, por não ter vontade de compartilhar de nada que eu faço com ninguém porque na verdade não estou feliz. Preocupados com a minha falta de exposição,  alguns me mandam mensagens querendo saber, e quando conto que estou deprimida, a reação é praticamente a mesma, eles me mandam parar com isso, deixar pra lá,  tomar uma vitamina C e esquecer, como se fosse uma simples gripe. Como se a felicidade fosse algo muito fácil de se achar e viver. Pois bem, vamos lá. O conceito de felicidade é debatido pelos filósofos quatro séculos antes mesmo de Jesus, o Salvador de nossas almas vir a Terra e começar a elucidar pro ocidente  que a paz interior seria o começo pra uma vida sem angústia. O povo que dissipou o evangelho era tipo nós os brasileiros. Explorados por Roma, escravizados, oprimidos por um governo corrupto, ladrão e hipócrita. Os fariseus ditavam as regras da moral e bons costumes e não eram , capazes de falar com uma samaritana ou ajudar um leproso. Queriam apedrejar a adúltera,  mesmo sem o adúltero cúmplice ao lado, como a propria lei dizia que era para fazer. O Mestre tentou colocar cada um no seu lugar, mas mesmo assim, dois mil anos depois parece que o Evangelho das boas novas se perdeu. Ou melhor, virou um esquema enriquecedor e muito próspero.  A igreja Católica unica detentora dos cânones,  se encheu de poder, e condenou, matou, queimou e destruiu tudo o que ela achava ser  contra a única verdade. Vendeu indulgências e ficou rica. Depois veio Lutero, que conseguiu abrir um pouco mais a mente e nos fazer entender, que o justo viveria pela fé. A graça é favor imerecido, não há o que você faça para pagar sua contas aqui na Terra, apenas crer que Deus existe, te ama e pagou suas dívidas.  Dívidas?  Mas eu nem pedi pra nascer! Ok, mas ja que é de graça mesmo, seguimos crendo (eu pelo menos ainda creio). Mas as igrejas evangélicas são ricas e pelo que me lembro, o único barraco que Jesus fez na porta do templo, foi para que não houvesse mercado no santuário. E hoje é o que mais tem, vendem milagres, louvores, shows, testemunhos, livros e fé por dízimos e ofertas baratinhos, parcelado no cartão. E o que era de graça mesmo??
Depressão é um negócio que conheço desde os 17 anos quando o meu pai desapareceu. Sim, eu tenho um pai desaparecido há vinte anos, ele saiu pra comprar cigarros e nunca mais voltou. Desde então,  a dúvida me habita. Questiono tudo, por não saber de nada. Segui meu caminho como todos os filhos de pais abandonados seguem. Por um tempo cheguei a me vitimizar por isso, mas depois de alguns anos, vi que muitos homens somem de suas familias e as mulheres que se virem para educar seus filhos na raça,  portando a mesma angustia da dúvida que eu. Por quê ele se foi? Como? O que aconteceu?  Mas dai a criança está com fome, e chora, e a vida segue, como eu e minha mãe seguimos. Essa depressão eu curei no altar, chorei aos pés de  Deus pedindo simplesmente que eu conseguisse seguir o caminho que precisava seguir. Foram dois anos de muitas lágrimas de dores de abandono.  O luto ainda permanece,  não o enterramos e não sabemos qual foi o seu fim. Trabalhei muito, carreguei muito peso, me esfocei demais para ser profissional,  ser adulta e continuar, ausência de angústia era ter o que comer, vestir e me locomover. Felicidade já não sabia o que era.
Minha segunda depressão foi quando meu chefe de BH morreu aos 36 anos de pneumonia, em uma semana. Eu morava em outro estado, trabalhava muito, e ele era o pai que eu não tinha. Me ensinou a fazer minha contabilidade pessoal, e nunca mais ter carnês da  Renner e cartão da  CeA. Foi um susto, e uma dor profunda. Dessa vez eu comecei a tomar remédios,  e me sentir um pouco melhor. Tanto que em menos de um ano eu casei. Precisava de alguém para não me sentir tão só.  Motivação errada para se casar, e meu casamento não deu certo, dessa vez eu fiz minhas malinhas, e voltei pra casa da minha mãe com outra depressão.  Pela terceira vez eu estava no buraco, sem respostas,  e com muitas angústias.  Pela primeira vez eu tomei uma decisão correta, fui estudar o que eu amava: teatro! Já no primeiro período da faculdade , a professora antes de me reprovar, amorosamente me mandou fazer terapia. Eu fui. Tomei antidepressivo por 6 meses, e fiz terapia por 3 anos. Estava indo  tudo bem, menos angústias,  e mais sentido na minha vida. Até que em uma aula de corpo,  eu me machuquei,  agachei e não levantei mais. Descobri duas hernias  de disco na lombar e senti dores fortes por um ano sem parar. Agora era angústia na alma, e dor na raiz do meu corpo. Minha quarta depressão profunda. Tudo foi melhorando quando comecei a fazer terapia corporal, tomei antidepressivo por um ano e aprendi a lição da ajuda, um post desse blog que sempre releio para não me esquecer. Com muita dificuldade consegui concluir minha faculdade , fazer monografia e colar grau. Ufa, menos angústia de novo, e talvez uma pontinha de felicidade e satisfação pessoal por ter conseguido enfim terminar com louvor o meu primeiro grande processo como atriz. Até que minha mãe teve câncer. Eu, filha única,  chorava só de pensar em perder a  minha mãe,  começamos o processo de operação,  retirada do tumor, quimioterapia, e eu tentei por 6 meses me manter forte, pra que ela também suportasse o processo. Agradeço aos poucos amigos, familiares, vizinhos que  me acompanharam e me suportaram durante esse 2013 que foi bem dificil. Hoje ela está curada e apenas fazendo os controles necessários. Sem esperar, porque não estudei, nem me preparei,eu em janeiro de 2013, consegui passar pra um concurso público pra ser professora de artes! Comecei a minha pós em licenciatura e tudo parecia finalmente caminhado para uma ausência de angústia constante. No ano seguinte eu tomaria posse, e na carreira de atriz, teria um pingado pro resto da vida, e trabalhando no que eu amo! Seria isso então a felicidade? Uma seguranca financeira, atrelada  a uma satisfacao pessoal?Esperando um telegrama para ser chamada, eu não acompanhei o edital, e eles me chamaram em abril e eu não vi. Descobri em dezembro, que perdi a minha vaga em abril e então desabei e estou aqui, na minha quinta depressão. Tomando antidepressivo de novo me pergunto então,  o que é felicidade? Pela filosofia,  a felicidade está para o homem, assim como um martelo está para pintar uma parede. O prazer, a ética e a moral, se misturam em lugar que se chama livre arbítrio,  onde fazer escolhas se torna a coisa mais angustiante e a mais coerente a se fazer. Um paradoxo, uma necessidade, algo muito longe de felicidade. Nesses últimos vinte anos, achei que estava fazendo tudo para ser feliz, e agora me vejo sem saber direito o que é felicidade. Palavra que vem de Feliz Cidade, onde o conjunto onde habito estaria satisfeito com sua ética estabelecida, coisa que no Rio de Janeiro, não existe. Existe uma propaganda muito bem elaborada pra que a gente possa acreditar nesse conceito tão utópico e mentiroso. Rio de Janeiro está um caos, o Brasil vai virar um caos daqui uns meses por causa da copa, e como eu serei feliz? Não serei. Não tenho mais  essa ilusão.  Tenho minhas dores, minhas dúvidas e incertezas, que me fizeram chegar até aqui. Tenho também algumas certezas que me norteiam, essas sim aliviam as minhas angústias. Sou fiel ao meu chamado,  e já não me anestesio das minhas responsabilidades. Espero que nos próximos 20 anos,  tudo tenha melhorado e que eu tire as minhas depressões de letra. Pois o que não me mata, só me fortalece. Se você souber de alguma receita concreta pra ser feliz, me mande, estou aberta a sugestões! 

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Verdade X Mentira - RING

Verdade X Mentira
 Trata-se de um jogo teatral. Ao ler a proposta do esquete nasceu assim.Pensei, repensei. Li e reli.  Me passam pela cabeça várias transições, e circunstâncias que posso sugerir, em cada frase..., dois executivos num bar, tomando um uísque, ou duas mulheres numa sala de ioga,... pode ser engraçado, pode  ser dramático ou tenso. Se eu definisse alguma delas, ele deixaria  de ser um texto contemporâneo, e permissível de tantas  e variadas possibilidades. Por isso, tomei a coragem de mandá-lo assim. Presunção me auto intitular escritora contemporânea, nada disso. Ë uma simples tentativa de justificar um texto quase infantil.

  X: Mentira!
  W: Não é mentira
  X: É mentira, eu sei que é.
  W: Tô te falando, dessa vez é serio.
  X: Se for mentira, que eu faço?
  W: Eu que vou saber? Eu sei que é verdade!
  X: Então me prova!
  W: Provo
  X: Então prova, rápido que eu tô com pressa!
  W: Tá com pressa de que?De ser mentira?
  X: Não, não estou mais.  Se for verdade, então eu não tenho com o que me preocupar.
  W: É verdade!
  X: Então é verdade!
  W: E você não vai fazer nada?
  X: Eu?Fazer o que?
  W: Alguma coisa!   
  X: A nem!Quer saber de uma verdade?Cansei!   
  W: Ah, mentira!
  X: Isso!Mentira!Eu cansei!Já que é verdade, eu também vou parar de mentir!  Vou falar a verdade!
  W: Mentira!Você não vai fazer isso!Eu não vou deixar!
  X: Você não vai deixar?Por quê?
  W: Por favor, não faz isso!  
  X: Não faço o que?Falar a verdade?
  W: Não faz nada!
  X: Mas você acabou de me dizer pra fazer alguma coisa!  Eu não ia fazer nada!
  W: Então não faz nada!
  X: Qual o seu problema com a verdade?Ela só serve pra mim?
  W: Qual o seu problema com a mentira?Não te serve mais?
  X: Nunca serviu.
  W: Mentira!
  X: Verdade!(longa pausa) É mentira não é?
  W: O que?
  X: O Que você veio me contar
  W: É verdade
  X: É mentira. Fala olhando nos meus olhos
  W: É verdade, to te falando!
  X: Olha pra mim!   
  W: É mentira.
  X: Eu sabia
  W: Você sabia?
  X: Sabia.
  W: Quem te falou?
  X: Ninguém.   
  W: Então como você sabia?
  X: Você quer saber a verdade?
  W: Quero.
  X: Você não sabe mentir!
  W: Verdade?
  X: Verdade.
  W: E agora que é verdade, o que eu faço?
  X: Eu que vou saber?Eu sei que é verdade!
  W: Então prova.
  X: Provo
  W: Então prova, rápido que eu to com pressa!
  X: Ta com pressa de que?De ser mentira?
  W: Não, não estou mais.  Se for verdade, então eu não tenho com o que me preocupar.
  X: É verdade
  W: Então é verdade!
  X: E você não vai fazer nada?   
  W: Eu?Fazer o que?
  X: Alguma coisa!
  W: A nem, quer saber de uma verdade?Cansei!
  X: Ah, mentira.
  W: Isso!Mentira!Eu cansei!Já que é verdade, eu também vou parar de mentir!  Vou falar a verdade!
  X: Mentira!Você não vai fazer isso!Eu não vou deixar!
  W: Você não vai deixar?Por quê?
  X: Por favor, não faz isso!
  W: Não faço o que?Falar a verdade?
  X: Não faz nada!   
  W: Mas você acabou de me dizer pra fazer alguma coisa! Eu não ia fazer nada!
  X: Então, não faz nada!
  W: Qual o seu problema com a verdade?Ela só serve pra mim?
  X: Qual o seu problema com a mentira?Não te serve mais?
  W: Nunca serviu.
  X: Mentira!
  W: Verdade! 
  Fim?



quinta-feira, 15 de junho de 2017

O luto do Jogo do Bicho.

Morre assassinado na madrugada do dia 14 de junho no Rio de Janeiro, Hayrton Escafura, filho de José Caruzzo Escafura, Seu Zé, ou Piruinha, como ele não gosta de ser chamado, mas é mais conhecido.
Como moradora da Abolição, criada em Pilares e arredores, posso com muita coragem falar desse homem.
Eu o conheci quando criança, minha mãe era compositora de samba enredo da Caprichosos de Pilares, e me levou muitas vezes lá em escolhas de sambas e festivais de chopps com canecas de porcelanas. Década de 80, século passado. Em um dos camarotes fui apresentada ao seu Zé, ele com seus cabelos brancos, baixinho, muito cheiroso e sorridente, sempre gostou de uma mulher bonita. Minha mãe além de bonita, era um acontecimento. " Chegou a Elka Maravilha de Pilares " - ele disse. Sim, Elka. Ele fala algumas palavras errado. Afinal, para quem não sabe, Giovanni Brota, personagem muito famoso de Senhora do Destino, foi inspirado no Seu Zé. Minha mãe tinha um Dodge Charge RT branco, e andava mais montada que a própria Elke, aliás, ainda anda. Seu batom vermelho, e os cabelos loiríssimos, e muito cheio, além dos chapéus e adereços, faziam a sua entrada triunfal em todos os lugares que íamos. Nesse dia, ele me pegou no colo, me disse que eu era linda, e perguntou o que eu queria comer. Tudo. Eu comia tudo para ficar acordada pelas madrugadas com minha mãe. Sentadinha no camarote, via minha mãe rindo e conversando com ele. Muitas vezes. Não só na Caprichosos, mas também no Sambola. Uma casa com varanda que tinha músicas ao vivo e onde passava as madrugadas rodeado de mulheres bonitas e músicos da área. Ele era e ainda é o Prefeito da Abolição. Contraventor do jogo do bicho, aprendeu com o próprio Castor de Andrade, o esquema cultural de se fazer uma fezinha. Cada esquina da zona norte tem um apontador, que faz o seu joguinho, e nos postes, diariamente, são colados os resultados. Você pode chegar na banca com seu papelzinho, que vai receber o seu dinheiro. Sem nenhuma dúvida. O jogo do bicho paga. O jogo do bicho emprega gente pra caramba, o jogo do bicho paga décimo terceiro, o jogo do bicho dá pensão às viúvas de seus falecidos empregados. O jogo do bicho sempre pagou seus impostos, por debaixo dos panos aos policiais corruptos para que continuasse a acontecer. Um esquema bem honesto, pelo que parece, mas não legalizado.
O jogo do bicho hoje está separado por áreas. Posso falar da minha. Por alguns anos, adesivos nos carros do Haras Escafura, era sinônimo de status. Só tinha quem era amigo do seu Zé, e seu Zé dava dinheiro para todo mundo. Sempre deu. Muito antes do Mr. Catra ficar famoso por ter muitos filhos, seu Zé já tinha 26. Todos recebendo suas pensões, estudando em escolas boas, e suas respectivas mães com suas contas em dia. Seu Zé é uma lenda. Seus filhos foram seguindo cada um o seu caminho. Estudaram, se formaram, trabalham em suas áreas, e outros seguiram os passos do pai. Empresário do ramo de animais, é assim que ele se define. Ele é o dono da banca. Adora jogar, mulher bonita, samba e seresta. Tem dinheiro para morar onde quiser no Rio de Janeiro, ou Nova Iorque, mas ele não sai daqui, é bairrista.  Se ele manda prender e manda soltar, eu não sei. Sei que ele ficou preso por 10 anos, e assim como o Pepe Mujica, aprendeu muito sobre a vida quando estava por lá. Ele até fala errado, mas é de uma sabedoria muito lúcida. Minha intimidade com seu Zé se dá pela amizade que ele manteve com minha mãe por todos esses anos. Lógico que ele também quis ter um filho com ela, mas minha mãe era muito apaixonada pelo meu pai, não tinha coragem, porque oportunidade não faltou.A acabou sendo a confidente dele sobre as outras muitas mulheres que o rodeavam.Mas ela era cantora, frequentava o Sambola, e vivia com ele. Ela conhecia algumas, era amiga delas, e dava conselhos. Tema algumas que são amigas dela até hoje. Com filha(o) dele, mas amigas da minha diva mãe.
Por alguns anos , não haviam assaltos na Abolição e arredores. Não havia tráfico no asfalto e muito menos milícia. Milícia não tem até hoje, agora assaltos tem. Seu Zé já tem mais de oitenta anos, e os bandidos novos não o conhecem. Seus carros são blindados, pois já sofreu algumas tentativas de assalto. Mas quem poderá matar o pato dos ovos de ouro? Acessível, sorridente e generoso, esse homem é muito mais ético que muitos políticos por aí. Ele possui uma legião de fãs e agregados. Muita gente recebe um trocadinho dos eu Zé para ajudar nas despesas,e ele dava. Hoje não dá mais. A crise também chegou no jogo do bicho. O funcionários mais velhos morrem, é preciso treinar novos e honestos parceiros. Sem contar que a minha geração não sabe jogar no bicho, eu não sei, nunca consegui aprender. Eu lamento, é um patrimônio cultural da história do nosso Rio de Janeiro, e parece que vai acabar em poucos anos.

Seu Zé já está cansado, e hoje enterra um dos seus filhos preferidos, sem nenhuma discrição sobre a sua preferência. O filho que deu mais trabalho, o mais abusado, o mais desobediente. Não foi por falta de aviso, para não se envolver com certas pessoas, o velho sábio sabia, mas o jovem empresário das máquinas parecia não ter limites. Foi preso, e como seu Zé sofreu ao ver seu filho com hepatite na prisão. Recentemente, na seresta que ele frequentava aqui na Abolição, onde eu pude ir muitas vezes com minha mãe, seus olhos estavam distantes, e quando conversava, vinha a lamúria e preocupação com Hayrton. Os dois últimos anos foram penosos para ele. Seu Zé não bebe, não usa drogas. Manda as garotas novas irem para casa cedo, dá conselhos como de pai, e nem de longe parece um bandido. Talvez a sua legião de fãs e agregados sejam assassinos e vingadores do Gangster Suburbano, porque ele, nem tem telefone celular, e também nunca o vi armado. Sua maior arma sempre foi o bom papo e uma lábia de conseguir o que quer. Foi mediador depois de alguns assassinatos de outras regiões do jogo do bicho, por ser o mais velho, o que sabe o certo a se fazer. Enterrou uns cinco filhos, mas esse, fez a Abolição inteira ficar de luto. Foi brutal. Sabe-se lá o que Hayrton fez ao sair da cadeia, e quantos esporros não levou desse pai. Porque até eu já tomei vários esporros dele, sem ter nenhum vínculo parentesco, mas eu sempre soube que era cuidado de pai, já que o meu não está mais aqui, e ele não deixou de ser amigo da minha mãe. Conselhos sábios, direções precisas, lucidez e sabedoria. Tudo que um bandido não possui. Um contraventor talvez, um incompreedido da lei, eu definiria.
Muita gente fala do que não sabe, muita gente julga sem conhecer, muita gente acha que o jogo do bicho está ligado à compra de armas, ao tráfico, a milícia, ou assaltos. Nada disso, pelo menos aqui na Abolição não. Seu Zé gosta mesmo é do jogo, e só. Roubar? Ele não precisa, ele é o dono da banca. Ser corrupto? Defina corrupto...Sérgio Cabral? A corrupção não vem de casa? Posso dizer que Seu Zé já até pagou o IPVA do meu carro atrasado, ou uma mensalidade da minha faculdade para que eu andasse certa. Ter adesivo no carro, se tornou mais bobeira que status. Polícia que para carro com adesivo do Haras não quer mais saber de nada, ninguém é liberado se não tiver seus documentos em dia, nem seu Zé, que é muito respeitado pelo simples fato de ser O Gangster Suburbano mais generoso que já se viu. Um dia ele deu de gorjeta para o frentista do posto, cinquenta reais. Não acreditei! Ele virou pra mim e disse: " Minha filha, você come uma nota de cinquenta reais? Não né? Dinheiro só serve pra isso, para que você saiba compartilhar com quem precisa e trabalha. Tenho certeza que dá próxima vez que vier aqui, esse moço vai me tratar melhor que todos os outros clientes, e eu gosto disso, isso me faz bem!".
Pronto, levei pra vida.
Esse é um dos poucos ensinamentos sábios que tive com seu Zé.
A partir de hoje , não sei o que vai acontecer. Essa morte pode o ter deixado muito triste, mas esse homem é uma fortaleza, e esse luto, essa tragédia suburbana, só vai fazer dele mais respeitado e mais sábio. Isso eu sei, como todas as coisas que escrevi e que muita gente não sabe, só especula.

Meus pêsames Seu Zé.



terça-feira, 13 de junho de 2017

depoisarte: Fui demitida...

depoisarte: Fui demitida...: Hoje, ao chegar na escola, fui dispensada. Nem um mês de trabalho, me demitiram. Substitui uma professora de Artes que estava coma filha doe...